quinta-feira, dezembro 15, 2005

MAIS UM ACONTECIMENTO TRÁGICO

O país foi abalado por mais uma bárbara agressão a uma criança de tenra idade. E mais uma vez a atenção incide sobre as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens, numa altura em que, depois de alguns anos de desinvestimento do Estado nesta rede não judiciária de protecção de crianças e jovens, existem alguns sinais positivos, o primeiro dos quais foi a nomeação do Juiz Conselheiro Armando Leandro para a presidência da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco, e o segundo a decisão de contratar novos técnicos para as comissões.
Lá ouvimos falar outra vez de alterações da lei como remédio para a prevenção de casos futuros, omitindo-se que a actual Lei de Promoção e Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, que está em vigor desde Janeiro de 2001, continua a carecer de regulamentação das medidas de promoção e protecção nela previstas e das estruturas de implementação que daí terão de decorrer. O que, a par da falta de investimento em meios humanos e formação, tem contribuído para que as suas potencialidades não estejam a ser integralmente aproveitadas.
Subscrevo, no que respeita às CPCJ, o que, em 1999, a propósito do sistema judiciário, defendeu Boaventura Sousa Santos: “A minha grande campanha neste momento é a de se reformar o sistema judiciário até ao ponto em que o pudermos fazer sem novas leis. Se esse desafio fosse aceite, poderíamos reformar muita coisa”. ·
O discurso mediático da procura imediata de culpados para além dos agressores é, por outro lado, um discurso de resultados contrários àqueles que aparenta, pois esgota-se na identificação de alguns bodes expiatórios, não permite que se extraiam conclusões com repercussão na prática futura e baixa a vigilância a partir desse momento.
As Comissões de Protecção de Crianças e Jovens são estruturas que têm sido suportadas, fundamentalmente, pela “carolice” de quem as integra, por técnicos de serviços públicos que acumulam estas funções às do seu serviço de origem que não lhes reconhece, na prática, a prioridade desta actividade consignada na lei e, nas cidades que têm ensino superior de psicologia e serviço social, por estagiários destes cursos. Esta situação é que tem de ser invertida: com investimento no aumento e qualificação dos recursos humanos, mas também através de uma melhor integração da actividade dos técnicos actualmente dispersos por múltiplas estruturas sectoriais; com respeito pela prioridade legal do trabalho nas comissões (ao menos!) dos representantes dos serviços públicos; por um investimento na formação e nas condições materiais de implementação das medidas de promoção e protecção.
Assim como é essencial a dinamização das Comissões Alargadas, para que cumpram as suas funções de informação e sensibilização comunitária, e de impulsionamento de programas e estruturas de apoio à infância e à juventude – actividade essencial ao nível da prevenção, do enraizamento de uma cultura de protecção das crianças e das condições de execução e do êxito das medidas aplicadas pela Comissão Restrita.
· “A Justiça em Portugal”, Colóquio do Conselho Económico e Social, 1999