segunda-feira, outubro 31, 2005

SYLVIA PLATH (1932 - 1963)

CONTUSÃO


A cor aflui ao local, púrpura e baça.
O resto do corpo está sem cor,
a cor da pérola.


Numa cavidade da rocha
o mar sorve obsessivamente,
uma concavidade, o centro de todo o mar.


Do tamanho de uma mosca,
a marca do destino
rasteja pela parede.


O coração fecha-se,
o mar retira-se,
os espelhos estão velados.


de Pela Água
trad. de Maria de Lourdes Guimarães
Assírio e Alvim (2000)




CANÇÃO DE ALVORADA

O amor deu-te corda como a um relógio de ouro.
A parteira bateu-te e o teu choro nu
Tomou o seu lugar por entre os elementos.


As nossas vozes são ecos, ampliando-te a chegada. Nova estátua.
Num museu frio a tua nudez
Ensombrece a nossa segurança. Rodeamos-te, vazio como paredes brancas.


Sou tão tua mãe como essa nuvem
Que destila um espelho, para assim reflectir
O seu breve apagar às mãos do vento.


Toda a noite a tua respiração leve
Tremula entre a planura das rosas. Acordo para escutar:
Um mar distante ondula nos meus ouvidos.


Ouço o teu choro e salto da cama, tropeçando, gorda e floral
Numa pesada camisa de noite.
Limpa como a de um gato, a tua boca abre-se. O caixilho da janela
Brilha e engole as estrelas opacas. Tentas agora
Uma mão-cheia de notas.
As vogais claras sobem no ar como balões.



Trad. de Ana Luísa Amaral
in aguasfurtadas - Revista de Literatura, Música e Artes Visuais
nº 7 - Dezembro 2004