quarta-feira, outubro 05, 2005

PUBLIQUE-SE A OBRA: PORQUE CONTINUA A SER IMPORTANTE!

Ao ler o nº2 da Revista do CEJ (a que voltarei) deparei com uma referência a uma investigação adjudicada pelo Gabinete de Estudos Jurídico-Sociais , cuja tema era Quatro casos com repercussão judiciária – Entre a realidade recenseada, a imagem criada pelos media e a reacção social, mas que acabou por ficar em três casos.
Este estudo foi feito pelo sociólogo José Luís Garcia (http://www.ics.ul.pt/corpocientifico/joseluisgarcia), tendo sido entregue ao Centro de Estudos Judiciários em 1999/2000 e apresentado numa sessão destinada a auditores de justiça em que o tema era a justiça e a comunicação social, mas depois não foi publicado por razões não alheias aos (ou 0) processos que constituíram o seu objecto.
O estudo, que pretendia “saber qual a imagem que fica de situações onde a polémica judicial e a polémica mediática se fundem e alimentam processos politicamente explosivos e divisões de opinião na sociedade civil", era norteado por três hipóteses:
“1. Diferentes públicos constroem diferentes sentidos dos mesmos eventos, realçando pormenores e retirando conclusões distintas;
2. Que os grupos com informação não-mediática conferem menor relevo à informação televisiva e cultivam un distanciamento crítico relativamente aos seus conteúdos;
3. É enorme a distância entre a componente jurídica e a interpretação dos grupos; estes podem ter uma opinião formada ao mesmo tempo que ignoram quase por completo os pormenores jurídicos do caso”.
Assim, para cada caso, foram constituídos três grupos a inquirir: “um grupo com uma ligação e uma proximidade muito peculiar com o evento, e outros grupos sociais de diferentes níveis económicos e culturais” (news game).
Os casos seleccionados, e os respectivos grupos, foram os seguintes: “caso da acusação de burla a um secretário de Estado” (vulgo, processo Costa Freire) – grupos: de profissões técnicas, de enquadramento e liberais; de sindicalistas; e de médicos; “caso buzinão” – grupos: de donas-de-casa; de estudantes do ensino superior; e de utentes da ponte 25 de Abril; “caso do impedimento da entrada no país de mulher de imigrante africano” (vulgo “caso Vuvu”) – grupos: de africanos; de estudantes do ensino superior; e de profissões técnicas, de enquadramento e liberais.
O enquadramento teórico, a análise empírica, o respectivo comentário e as reflexões finais desta investigação constituem um documento de estudo que deveria ser divulgado.
Cito apenas um excerto do comentário aos resultados da análise empírica, sobre a relação entre a linguagem comum e a linguagem jurídica:
“[A] resistência da linguagem ordinária à tentação colonizadora do discurso jurídico pode ser explicada por dois factores: o primeiro, mais comum, aponta para o hermetismo da linguagem jurídica e para a dificuldade que tanto os media como o público têm em compreendê-lo, incorporá-lo, reproduzi-lo; o segundo, menos usado, sublinha o espaço de liberdade que as pessoas necessitam para formar uma opinião e que sentem ameaçado pelo poder simbólico de um discurso que elas, por lhes faltar a competência específica, não conhecem nem controlam. Por outras palavras, o público dificilmente pode fazer com o discurso jurídico o que faz com notícias veiculadas pelos media: “instrumentalizá-las” para reforçar a sua opinião. O discurso jurídico, muito menos flexível e “manuseável” do que o mediático (com o qual as pessoas estão fortemente familiarizadas e socializadas, sendo um discurso que elas conseguem até reproduzir ..) é visto, pois, como uma ameaça à liberdade que as pessoas pretendem manter intacta: a de opinar, moralizar e interpretar a realidade através da sua linguagem”.

TUDO ISTO PARA DIZER: PUBLIQUE-SE A OBRA PORQUE CONTINUA A SER IMPORTANTE!