terça-feira, setembro 13, 2005

PATERNIDADE BIOLÓGICA E PATERNIDADE SÓCIO-AFECTIVA

Numa das mesas da II Bienal de Jurisprudência Luso-Brasileira, cujo tema era Investigação de Paternidade e Negatória de Paternidade, debateu-se a questão da prevalência da paternidade biológica ou da paternidade sócio-afectiva.
No Brasil, existe uma forte corrente jurisprudencial que privilegia a paternidade sócio-afectiva em detrimento da paternidade biológica, defendendo que “pai é quem cuida, quem dá afecto”.
Foi apresentada e debatida uma decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que, em síntese e em linguagem simples, se pode descrever da seguinte forma:
- um menor tinha um pai que constava do registo civil, que vivia com a mãe, e que com ele tinha uma óptima relação afectiva, mas pai e mãe sabiam que o pai biológico era outro;
- morreu o pai biológico, que era rico, enquanto que o pai que constava do registo era um “duro”;
- este manifestou, na família, a posição de que era um “duro”, que o pai biológico tinha deixado uma boa herança, e por isso não levava a mal que pusessem em causa o que constava do registo civil, pois a sua atitude seria a de continuar a tratar o menor como filho, como o tinha feito até então;
- foi proposta acção judicial com vista ao estabelecimento da paternidade biológica e o tribunal, embora tivesse sido feita prova desta, indeferiu a pretensão por ter entendido que deveria prevalecer a paternidade sócio-afectiva.
Em Portugal, onde impera na legislação uma perspectiva biologista, dificilmente a decisão teria sido no mesmo sentido.
Mas, citando de um texto (cuja releitura nos traz sempre coisas novas) que, com o sugestivo título “Queremos amar-nos ... mas não sabemos como!”, Guilherme de Oliveira publicou no nº 3911/3912 da Revista de Legislação e Jurisprudência, de Junho/Julho de 2000, a verdade é que, também entre nós “de facto, está cada vez mais presente a discussão acerca da preferência absoluta pela verdade biológica, ou sobre a determinação dos casos em que a verdade sociológica ou afectiva deve ser o critério da paternidade; e não se prevê que esta incerteza chegue a um termo, numa época em que se pretende tudo à medida do indivíduo, em que se escolhe sempre e nada é predeterminado. O aumento do número dos divórcios e dos segundos casamentos multiplicou as situações de concorrência entre a paternidade biológica e a paternidade afectiva; o crescimento da filiação adoptiva tem produzido o mesmo efeito; e a procriação assistida com dador e as maternidades de substituição também já têm a sua quota nesta matéria. Estas situações de concorrência, note-se, têm dado primazia às paternidades afectivas em detrimento das paternidades biológicas – assim, pelo menos, no que toca à ruptura dos laços de parentesco com a família de origem no caso de adopção, e também no caso de inseminação com dador anónimo”.
Venho defendendo que o Ministério Público, quando, no exercício das suas funções, obtém elementos que lhe permitem concluir que o pai que consta do registo de nascimento de um menor não é o pai biológico, não deve tomar a iniciativa de instaurar acção de impugnação de paternidade se, com isso, a única coisa que vai conseguir é “roubar” ao menor um pai, que assumiu integralmente esta função. Ou seja, nestes casos, que acontecem com alguma frequência, a questão da paternidade sócio-efectiva tem de ser ponderada como uma vertente do interesse da criança, postergando-se o interesse do Estado na reposição da verdade registal (que, muitas das vezes, conduziria a uma omissão da menção da paternidade).

1 Comments:

At segunda-feira, 20 fevereiro, 2012, Blogger lewis87 said...

Caro Rui,

Talvez me consiga esclarecer/ajudar.
A minha namorada tem um filho de pai incógnito. Nós não somos casados, mas vivemos juntos. Eu gostaria de registar a criança como meu filho. Onde tenho que me dirigir, como fazer...pode-me ajudar?

Obrigado

Bernardo

 

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