quinta-feira, agosto 11, 2005

COMO NO TEMPO DO MEU PAI

O meu pai era comerciante. Tinha sido caixeiro. Os que mais jeito mostravam para o negócio, que se mostravam mais capazes, iam ganhando a sua clientela e a certa altura decidiam estabelecer-se por conta própria, assim se chamava. Ter empregados que se estabeleciam era um sinal de prestígio para a casa-mãe. Os patrões ajudavam – davam conselhos, eram os fiadores do arrendamento e davam garantias aos bancos e aos fornecedores, emprestavam dinheiro ou davam boas referências a um sócio-capitalista, cediam o guarda-livros que os ia pondo ao corrente do negócio, indicavam a nova loja aos clientes que pediam alguma coisa que não tinham e até nem se importavam que o ex-empregado levasse alguns clientes consigo. E quando as coisas ao fim de algum tempo não corriam bem, o que às vezes acontecia, o caixeiro lá tinha geralmente outra vez o lugar dele. E o ciclo renovava-se. Ainda hoje uma boa parte dos comerciantes da baixa de Coimbra foi assim que o passaram a ser.
Ora, eu comecei como caixeiro no Incursões e ao ter-me agora estabelecido por conta própria no Mar Inquieto, ainda sem saber se tenho pernas para o negócio, sinto-me como no tempo do meu pai. Tenho de provar a mim e ao meu ex-patrão, que, cumprindo a tradição, me tem ajudado. E a quem agradeço também o prazer de poder continuar a fazer umas horas extraordinárias por conta dele.